quarta-feira, 24 de agosto de 2022

24.8.2022 - One Day minus 22

 


O nosso Mundo ainda estava intacto aqui: foi em Abril deste ano.  Apanhava os Jarros na Quinta do Miguel e punha-os nas jarras de família, junto às fotografias, em cima das cómodas, como a Oma e a sua bisavó faziam. Os gestos não se esquecem, através dos hábitos enraizados em nós, percorrendo  décadas de vivências em comum, perpetuando-se num quotidiano que não sabemos explicar, porque sempre esteve latente no nosso âmago!

Hoje foi um dia cansativo. Tudo o que poderia correr menos bem lá obra correu menos bem, mas eu aprendi com o Pai a ser perfeccionista e levo quem trabalha, lá na obra, à loucura. Bem, loucura soit disant, que loucura é o que vivemos hoje sem si. Tudo o resto é um tango descompassado, fandango desafinado, música sem ritmo, melodia monocórdica, que ecoa aos nossos ouvidos, sem nos despertar qualquer vontade de dançar.

Escrevi tanto e (ainda) tão pouco sobre si...mas tenho também uma história gira para lhe contar:

O Zapa fugiu hoje de manhã. Quarenta e nove quilogramas de cão de meter medo, mas a obra chamava e havia muito que fazer e lá fomos, deixando o Zapa entregue aos Caminhos, às Oliveiras e às ovelhas do Pastor. 

Como lhe escrevi foi um dia mega cansativo: havia tacos com bicho, o roço exterior foi esquecido, o sótão ainda está cheio de porcaria e mil e uma outras coisas: entre elas comprámos - finalmente- a churrasqueira. Vai ser difícil não olhar para lá no próximo verão sem vislumbrar, através do fumo, a sua silhueta perfeita a grelhar um peixinho! Mas a isso voltarei mais tarde, são reminiscências de uma outra vida, aquela que agora não ouso recordar, para não perder a sanidade mental.

Depois de um dia extenuante de obra, lá fomos alimentar os cães. O Zapa tinha voltado e uivava ao portão. Sentei-me numa pedra do pomar, e olhei para o céu, à procura da Libelinha, que no outro dia me veio cumprimentar. Não vi a Libélula, mas o pôr do Sol, escarlate e púrpura, amarelo e laranja, ocaso por acaso de tanta coisa que se desfez no horizonte, como num crepúsculo sem fim, iluminava o fim da tarde. E enquanto refletia, e os meus dedos procuravam mais uma fotografia de um passado feliz, o meu telefone tocou. Era o António.

E mais um vez percebi, ou melhor, senti e pressenti, que aquilo de que me apercebo, é real. Há um hiato no tempo, uma porta que está aberta, escancarada, em cuja ombreira você espreita e sorri, enquanto eu voo para lá, sem tocar o chão, porque parte de mim é Céu. 

É UNO consigo. 

E é nessa ombreira que você me diz, baixinho, naquela sua voz que me ressoa todos os dias ao ouvido:

- "ÉPICO Mãe. Orgulho em si! Continue!"

E é nessa ombreira intransponível, nessa porta invisível, nesse limiar entre o Aqui e o Aí, que NOS (RE)encontro, e páro e fico tal qual estátua, numa estática meio dinâmica, entre o passado e o futuro, a observar maravilhada. Porque sei que tenho imenso trabalho pela frente. E cá estou, como você me sempre me recordou, com o corpo às balas, de peito aberto, (porque) com a sua imagem no coração!

- "Vamos a ISSO!"

Mil beijo Filho lindo,

Mami


P.S.: Amanhã vou puxar fios com o eletricista, que, pelo menos, colocou os interruptores a ligar e a  desligar na posição certa, mas que precisa de uma ajuda para acelerar o trabalho:-)!


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