quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

25.1.2023 - One Day minus 176 - in You I trust!

 



- "Mãe, eh pah, Mãe, acalme-se lá um bocado! Tem ou não tem confiança no seu Filho?

- "Claro que tenho, sabe perfeitamente que sim!"

- "Então Mãe, pare de se preocupar, ok? Eh pah, não sei se é do frio, se é...sei lá do quê, mas a Mãe congelou o cérebro, de certeza! A Mãe não existe! Acha que eu não sei zelar por mim? Já fiz imensos Amigos aqui, a Mãe não vai acreditar! Esta malta adora-me! Sabe como é, e tal e coisa, lança-se o charme, e pronto, como diz a Oma: "Vinte, cinquenta, que se lixem os trocos", ahahahahaahahahahahahahaha, até aqui me lembro daquelas gargalhadas que dávamos juntos, enquanto a Mãe fugia para a casa-de-banho com vergonha, e o Duda se escondia atrás da ementa das sobremesas! Grandas jantaradas, como aquela célebre noite no Pinóquio, em que a Oma deu um show? Eh pah, aquilo foi top Mãe, lembra-se?"

- "Como é que eu jamais me poderia esquecer Filho querido?"

- "Sei lá Mãe, a Mãe está a ficar velha. Já se baralha toda! Bom, mas não me interrompa, senão esqueço-me. Já encontrei a Tátá, está igual Mãe, IGUAL! Claro que me continua a coçar as costas, e a levar-me aos melhores restaurantes daqui de cima. Mas esta malta não percebe nada de servir à mesa. Sabe como é Mãe, falta-lhes aquele "touch" humano..."

- "Oh Filho, mas claro, são Almas..."

- "Sei lá o que são Mãe, esta gente é toda marada, isso é que é. Todos queimados!" Já reparou que não digo palavrões Mãe? Pois, não posso. A Zézé, sempre que me escapa um, tosse, a fingir que se engasgou, porque a Avó Lourdes passava-se. Finalmente conheci a sua avó, Mami, ela é mesmo um dragão. Porra, até aqui no Céu quer meter ordem! A malta diz-lhe toda que sim, porque se borram de medo dela. Depois já comecei a ter aulas de alemão com a sua Oma. Mãe...,ela é uma bacana, super querida! Faz-me mil e uma perguntas sobre si, e conta histórias de uma casa qualquer no Largo Conde de Ottolini, diz ela que tinha uma varanda fantástica. É uma velhinha porreira, mas manda no Opa. A Mãe tinha razão, eu sou parecido com ele. Eh pah, oh Mãe, o tipo tem histórias únicas, a Mãe não acha? O velhote era de fibra, mas ninguém diria, porque é um porreiraço. Depois há aqui uma data de gente de que eu não me lembro, primos e sei lá, uma data de gente, mas que eu não sei quem são! A Tiá, só a vi passar uma vez, disse-lhe adeus. Apesar de continuar a não ter pernas, anda na bisga Mãe, e está igual. Tão pequenina Mãe, mas igual ao que me lembrava dela.

- "Que bom Filho, que bom saber que conseguiu rever essas pessoas todas da sua infância, da minha Vida! Que bom saber que está bem. Faz cá falta...

- "Eh pah, oh Mãe, faço o que posso. Mando a Coruja piar todas as noites, e hoje voltei a mandar-lhe um bocadinho do meu perfume, quer mais o quê?"

- "Não quero nada, Filho, quero um MILAGRE!,

(Mas esse, já o tenho com as nossas conversas!)"

- "Bom Mãe, tenho aqui outra chamada, ligo-lhe já de volta, ok Mãe? Ligo-lhe daqui a dois minutos. Prometo!"

- "Adoro-te Filho, até já, não se esqueça de ligar!"

domingo, 22 de janeiro de 2023

22.1.2023 - One Day minus 173 - (dias), somados à Saudade e subtraídos à Felicidade, multiplicados por Amor, a dividir por si e por mim!

 



Bicho,

22.1.2023...

...há parecença nos números, são também 173 dias sem si, voltamos ao 7, e agora ouço-o a rir a bandeiras despregadas. 

Interrompi a costura, e nem sei o que lhe diga, pairei entre o ontem do ontem, e o amanhã de hoje, até às seis e catorze "matutinas", a criar, pensava eu, uma obra prima de aprendiza, quando, com orgulho apressado, vou buscar o interior da dita, o miolo, o umbigo, feito de penas de uma almofada alemã que decidi reciclar, para triunfalmente celebrar que sabia costurar, e ao levá-lo ao encontro do ventre daquela fronha suada, (re)costurada, misturada com uma merecida pausa para mais uma carta para o meu Anjo, temperada com o consolo de umas bolachas Maria seriam umas quatro e meia da manhã, constato, com inconsolável desgosto, que sobravam trinta e sete centímetros de fronha. Trinta e sete centímetros de erros de quem persiste.

Bom, acho que na métrica da minha vida, seriam sete metros e trinta e sete centímetros de erros bem medidos, alinhavados de arrependimento, numa aprendizagem cortada a esmero, mas de resultado positivo, naquela matemática que só na minha cabeça funciona, e onde a Prova dos Nove bate  sempre certa! 

Noves fora Nada...e do Nada temos de reconstruir a melhor miragem do Tudo, para que o Universo bata certo. Ou será que é do Nada que tenho de reconstruir o Universo, na procura incessante do (meu) Tudo? Bruno Mars e as nossas cançonetas desafinadas, trauteadas entre sorrisos cúmplices, no regressar de almoços de peixinho grelhado, e tantas, tantas, mais mil e oitenta e uma memórias! 

Quando eu era pequenina, guardava oitenta e um, mais mil beijinhos, numa caixa de pastilhas Valda, que a Zézé tinha encontrado no meio de mais mil e uma "quitandas" que faziam as delícias da sua gaveta secreta, e que me ofereceu quando fui de férias para casa do Opa. Para que a Oma, a Tiá, a Zézé, a Avó Lourdes e a Tia Taxa, rebaptizada por si de Tátá umas décadas depois, pudessem lá ir buscar um beijinho meu, daqueles repenicados, mas sempre um de cada vez, com acerto nas contas, para que não se gastassem até ao meu regresso. E lembro-me que nas noites desoladas, frias e húmidas da "Coutada", onde eu tinha medo do escuro, e ainda mais saudades de casa, abria a caixa debaixo dos lençóis com muito cuidado,  para que não escapasse nenhum, até porque os beijinhos são invisíveis aos olhos, como o Essencial, mas perceptíveis ao tacto, e no meio das lágrimas, esses beijos eram o doce da água do Amor, a contrabalançar o sal da Saudade.

São esses beijos que lhe deixo hoje Filho meu, cuja voz ouço neste aqui e agora da minha (sobre)vivência, nesta existência inesperada e inusitada, mas sofridamente e diariamente sobrevivida a cada minuto, cada hora, cada dia, em sua memória, nessa breve história de apenas vinte e seis anos, uns meses e mais uns dias, nesse Futuro roubado, aniquilado, destruído, nesta costura torta, mal alinhavada, bainha mal cosida, por mãos de aprendiza!

Mil beijos meu Amor,

Mami!

 


sábado, 21 de janeiro de 2023

20.1.2023 - One Day minus 171, quase 172...Divagações


Timzota, boa noite!

Não sei se escreva ou se costure, se ria ou se chore, se me envolva de silêncio, ou de música. Opto pela escrita, pelo (sor)riso, tempero necessário a continuar a minha Caminhada, e por Dotan. Acho que fiz uma boa escolha, certo? A música nunca faltou na nossa Vida, aliás, era o ritmo de fundo na Rodrigues Lobo, e depois, na Alegre Casinha. Lembra-se de nós, a dançar, naquela cozinha minúscula, de seis metros quadrados, enquanto as panelas fumegavam? Você adorava mostrar-me novas músicas. Como Dotan, claro, ou Parcels. E eu ficava fascinada, porque gostava de todas. Depois do jantar, de barriga a abarrotar, sentávamo-nos no sofá, com as velas à frente, a projectar sombras contrastantes com as luzes led dos candeeiros bordeaux, e discutíamos Burning Man e Tomorrowland nos sonhos, sempre tão característicos, que partilhávamos.

Começávamos as nossas viagens nessas conversas, e nessas conversas viajávamos no sonho, era também nessas conversas de sonho que partilhávamos da nossa essência tão próxima, tão semelhante, tão transcendental, especial, universal, porque inseparável no seu cerne.

Meu Filho, estou mais em paz. Não que a vida não me ande a colocar à prova "big time", é de todos os lados, e é um conversa para um outro dia, mas porque a costura me tem (e)levado a um constante e viciante estado Alpha. E este estado de hiptnotismo criativo e meditativo, tem-me proporcionado sorrisos, dádiva do Universo, e sua, claro, porque sei que é isso que você sente meu Anjo querido, meu Príncipe, e ouço a sua voz a dizer-me:

"Adoro-te Mami, orgulho em si!", 

como se estivesse aqui ao meu lado. Estivesse? que forma tão estúpida de conjugar o verbo, num Presente do Indicativo sombreado a Gerúndio! 

Você está, eu estou, nós estamos, hoje e sempre. 

E a propósito disso, de estarmos, ando a ver o Masterchef Australia. É outra forma de droga saudável, porque não tem contra indicações, não custa dinheiro, excepto a mensalidade da operadora, e estimula os sentidos. Então hoje, como a criatividade estava ao rubro, e o perfume da sua Alma me envolvia em carinhosos afagos, resolvi improvisar na cozinha, e satisfazer o capricho de sujar sete tachos e panelas, algo nunca antes experimentado, mas que libertou o meu espírito rebelde numa satisfação quase infantil. E como a costura é inimiga da rebeldia, e eu acho que ando a dar uma de Beatriz Costa, numa miragem de candidata do Masterchef do outro lado do Mundo, resolvi que pela primeira vez na vida, iria seguir à risca o tempo de cozedura, versus o peso da massa de Sépia, e a quantidade de água. O improviso foi salmão braseado, corado em sauté de camarões, aromatizado com alho, cebola caramelizada e tomate, suavizado com natas de soja, zero colesterol, versão light. Ou, por outras palavras: comprámos um salmão inteiro, porque é muito mais barato, decidimos dividi-lo para vários pratos, não me apetecia nada ir para a cozinha, tínhamos pasta nera de Sépia, fui ao canteiro buscar Cebolinho, ao congelador à pesca de uns camarões congelados, às cebolas que a Dona Fernanda me deu, e aos temperos, dei uma de vampe televisiva na cozinha, e em estado Alpha, com as informações a brotar em em catadupa do Universo,  fiz uma pasta FANTÁSTICA! 

Não tenho dúvidas que é o seu Amor meu Filho, a suavidade do seu Abraço transcendental, sideral na essência da sua existência, num passado que é presente, portanto dádiva, e ao mesmo tempo, futuro infinito, como o TUDO que sinto por si. Meu Filho, nunca pensei dizer isto, mas a Costura traz-me PAZ!

Meu Amor querido, meu Filho, transbordo de Gratidão!

Mil beijos meu Amor, da sua Mãe que o adora,

Mami


P.S. Se eu pudesse, se eu tivesse o dinheiro, transformava a Adega e a Casinha de Xisto, num refúgio para mães de(s)filhadas...para que reencontrassem um pouco desta paz. (Deixo-o com as primeiras flores da nossa Cameleira)...PEGOU! :-)


sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

20.1.2023 - One Day minus 171 - De Comparações e outras Divagações , "Tiny Dancer"

 


Meu adorado Tim,


Tenho andado longe das nossas cartas - destas assim preto no branco, porque as outras são constantes - por várias razões, que lhe passo a explicar: A Oma lá fez a intervenção. A primeira parte correu bem, mas temos de esperar mais algumas semanas, que mais parecem anos, para sabermos se está tudo devidamente consolidado. Lá bem instalada está ela: cá fora onze graus no pino do "calor", lá dentro vinte e três, portanto temos de zelar para que assim permaneça, quentinha e aconchegada, mimada q.b. e pelo menos a sentir-se mais acompanhada. 

Entretanto, apanhei uma virose ou uma intoxicação alimentar tão grande, que fui parar ao hospital. Sentia-me tão mal, tão mal, que pedi ao Miguel para não me levar para Santarém, porque achei que não iria aguentar a viagem. Ora trocar "isso" por "aqui" é uma loucura, mas demonstra o quão doente estava. Demorei uns dias, mas hoje já me sinto melhor.

Tudo isto também me tem levado para longe do meu novo "hobbie", que me fascina cada vez mais, e do qual lhe venho falar. 

Bom, este passatempo - escrevia eu - é talvez a forma mais perfeita que conheço, para envolver o ser humano em várias áreas ao mesmo tempo, desenvolvendo, portanto, uma série de capacidades e de aptidões em simultâneo. O que me ocorre primeiro é a Concentração, sem ela não se costura. Depois o Cálculo: entra a Matemática, ciência que me transcende, e que como você se lembra, tantas gargalhadas vos arrancava em criança, quando o Pai vos contava, detalhadamente e a morrer a rir, sobre a desgraça que eu era aos números! Soma-se a isto a Motricidade, pois sem saber manter o pano e as linhas agilmente nas mãos, vemo-nos presas num emaranhado labiríntico, que acaba por encravar a agulha, interrompendo-lhe a dança, e esta, furiosa e com birra, resolve partir-se. Estamos então perante outra enorme virtude, necessária a quem aprende a coser à máquina: Perseverança, que se deveria escrever em letra de imprensa, para libertarmos essa salgalhada. Segue-se a Física. Quem nunca viu uma máquina de costura por dentro, não imagina a precisão da Mecânica das peças da mesma, que, miraculosamente, e numa meticulosa exactidão, num passe de magia, cumprem as suas funções.  Mas agora é que está o caldo entornado. Porque temos que sentir Coragem, e entrar nesse Mundo encantado da Precisão. Com chaves minúsculas, e dedos de fada, e "Um olho no livro de instruções e outro nessas assustadoras entranhas", vulgo, "um no cavalo e outro no cigano", desenroscamos um pequeno parafuso, e então, bom, então desesperamos. Encontramo-nos perante um enorme desafio, literalmente chamado "Encontrar uma agulha num Estaleiro", porque palha não há, mas há metal com fartura. Dá-se então uma amálgama de (re)acções que acontecem em nanossegundos. Com  autoconfiança reforçada por visualização positiva, e com toda a nossa Fé, porque suplicamos a todos os Santos, lá conseguimos encontrar o resquício da birra da nossa Prima Ballerina. Após horas de tentativa e erro, quando finalmente cosemos uma bainha de trinta centímetros, libertam-se milhões de endorfinas, e sentimos Completude, o objectivo de muitas formas de meditação que conheço. 

E à medida que vamos aumentando essas bainhas, surge a Criatividade, ao idealizarmos os nossos futuros projectos, encontrando Elação quando os conseguimos transpor para o papel, daí para o tecido, depois para o corte, até finalmente, termos a obra finalizada. À medida que a nossa dançarina vai aprendendo a rodopiar, envolta pela destreza das linhas, somos levadas através dos tempos até às nossas mais tenras memórias, aquelas que estavam esquecidas faz muito nas gavetas empoeiradas das recordações felizes, e no meio desses resquícios de tempos despreocupados, lembramo-nos de como a Alice punha os olhos, não nos pontos, mas no tecido. Não era a bailarina que a preocupava, era o chão que ela pisava, e nesse seu pisar, ia deixando as suas peugadas coloridas. 

Filho, querido, é bom ter alguns destes momentos mais suaves, nestas noites geladas no centro de Portugal, serões invernosos, onde você e todos os milhões de Anjos que já partiram, contrastam num céu incrivelmente límpido, e de um azul tão profundo que roça o negro, enquanto no jardim se ouve a minha Coruja, momentos em que larguei os ensaios do meu bailado, para coser a saudade que sinto por si, no brilho que vislumbro pelas portadas da janela. 

No SEU brilho! 

Mil beijos meu Amor!


Blue-jean baby
L.A. lady
Seamstress for the band
Pretty-eyed
Pirate smile
You'll marry a music man

Ballerina
You must've seen her
Dancing in the sand
And now she's in me
Always with me

Tiny dancer in my hand 

domingo, 8 de janeiro de 2023

8.1.2023 - One Day minus 159 - Tanto!


 

Meu adorado Filho,

Tenho andado meia longe das nossas cartas, conquanto fale consigo, em silêncio, a todas as horas do dia. Descobri um novo hobbie, e com isso, revivi momentos da minha infância. A Avó Lourdes, no quarto dos arrumos, tinha uma Singer, na qual, todas as terças-feiras, a costureira vinha fazer arranjos, emendas e roupas novas. Lembro-me, de em criança, adorar mexer nas canelas - achava-as amorosas, porque eram minúsculas e lembravam-me carrinhos de linhas de bonecas, e de ficar fascinada sempre que a costureira, acho que se chamava Alice, conseguia enfiar a agulha e fazer magia nos tecidos. Nunca me achei capaz de sequer fazer uma bainha - certo, confesso que ouvir constantemente que uma canhota nunca iria aprender a coser me marcou - muito menos de entender os mecanismos de uma máquina.

Se você se lembrar, recorda-se perfeitamente que nos últimos anos eu falava constantemente que queria fazer um curso de costura. Bom, acontece que nada "acontece" por acaso, e descobri a Gigi, e me inscrevi nas aulas com ela. Com os vales da Amazon que recebi do escritório, decidi-me a algo que em tempos normais, jamais faria: comprei uma máquina de costura. Valha-nos o século vinte e um e os tutoriais do youtube, o que é facto, é que aprendi a mexer na máquina sozinha. Depois da primeira aula com a Gigi, e de muitas noites de roda da máquina, de partir várias agulhas, destruir um número significativo de carrinhos de linhas, e de decorar o livro de instruções, hoje consegui fazer o meu primeiro saco de tecido para guardar as tesouras.

Estou orgulhosa!

A costura é, tal como o restauro, uma espécie de meditação, com a vantagem de não fazer tanta porcaria, nem de precisar de tanto espaço. O grande senão, é que, pela primeira vez aos cinquenta e seis anos, me vi forçada a - oficialmente - comprar uns óculos de ver ao perto, senão não conseguiria. Mas depois de dar mais essa vitória ao Universo, a de que estou oficialmente pitosga devido à idade, confesso que o prazer que retiro de costurar, é imenso. Certo, dou a mão à palmatória, o melhor de tudo nem é o sucesso, é o de ser auto-didacta e de aprender sozinha. Na terça-feira vou para a segunda aula, já com o plano ambicioso, de fazer umas calças. Superar estes pequenos obstáculos ajuda-me a continuar neste caminho tão duro, tão solitário, tão triste!

Tenho tantas saudades suas meu Amor pequenino, meu Tim, minha Vida! Saudades de tudo, saudades de si, das nossas conversas, do Amor traduzido nas palavras, da sua ânsia, da sua sede de viver, tão parecido com o que eu fui durante cinquenta e cinco anos. 

A Oma já mudou para a nossa casinha e, ao preparar tudo para ela ter o maior conforto possível, tirei os casacos do bengaleiro do primeiro andar. Ao movê-los, veio-me uma ténue recordação do seu cheirinho, ainda suavemente impregnado nos tecidos, e as lágrimas correram livremente. Aquele seu cheirinho sempre tão aprumado, tão doce, tão suave, tão...

SEU!

Que saudades meu Amor! Que falta, que caminho tão duro, tão estranho, tão desumano na sua injustiça. 

De resto, a existência segue o seu curso, e as pessoas pensam que a vida continua. Continua, mas não é vida. É sobrevivência. 

Hoje lembrei-me do El Sur. Da salada César, com "croutons", daquele parmesão, cujas lascas se derretiam na boca, naqueles fins de tarde de fim de Verão, do calor de Barcelona, da Alegria sempre que nos reencontrávamos, de si à minha espera em Plaza Cataluña. De saltar do autocarro vinda do aeroporto, directa para o seu abraço, forte, genuíno e tão cheio de carinho. Dos gritos que eu dava sempre que vislumbrava uma barata nojenta, e você se ria de mim. Lembro-me do seu quarto, de quando fomos comprar almofadas novas, toalhas, frigideiras e outro número sem fim de coisas para aliviar as suas saudades por estar longe de casa. 

Quero voltar aí Tim, onde fomos felizes, eternos cúmplices, de descobrir cidades consigo, no fascínio constante pela Vida e pelas surpresas boas que ela nos trazia. Dava a vida e tudo o que tenho para voltar aí meu Amor, para o ouvir falar do próximo relógio que iria comprar, para discutir os melhores vinhos do ano, e os restaurantes onde iriamos provar as iguarias, para o ouvir a contar as últimas peripécias, e rir às gargalhadas. Como é que se reconstrói uma existência após a morte de um Filho? Como? Haverá algum dia uma saída deste buraco negro? Ou tratar-se-á apenas de uma aprendizagem nova de uma de vivência diária com uma dor incomensurável? Será que se aprende a viver com esta dor? Ou serão os dias nada mais que uma sucessão de ausência física, de saudade, de morte em vida?

Não sei meu querido Filho. Sei apenas que...

...a SAUDADE é algo que dói tanto, mas tanto, tanto, tanto, que não há NADA que a atenue. 

Tim...

TANTO!

Mil beijos,

Mami


domingo, 1 de janeiro de 2023

1.1.2023 - One Day minus 152 - Life!

 



Meu adorado Tim,


Cá estou eu de novo a escrever-lhe o que não tenho tido coragem para colocar preto no branco. O ano terrível de 2022 acabou. Finalmente. Faz amanhã cinco meses sem si da forma como sempre conheci. As saudades são indescritíveis, mas o Universo deu-me um presente.

Ontem à tarde nasceu o Trinta e Um. Um cabritinho amoroso, filho da Branquinha, que veio trazer alguma Alegria a esta casa. Os animais são uma verdadeira terapia para mim, ver as interacções, as brincadeiras, dar tangerinas às ovelhas e à Mocha, que hoje se empoleirou com as patas dianteiras no meu peito, na sofreguidão de comer mais do que as outras, e que me ia deitando ao chão. Fiquei com lama até às orelhas, mas foi um bálsamo, porque quando estou com os bichos, esqueço-me de quase tudo. É uma forma de nos ligarmos ao Cosmos, que me apazigua a dor e me faz sentir parte do Universo.

A Oma está finalmente um pouco melhor, e para a semana vai para a nossa casinha, onde se vai seguramente sentir bem. É muito mais pequenina, e fácil de aquecer, e tem todo o conforto para ela começar a ser mais independente. 

Chove como se não houvesse amanhã, já temos os muros, pintados de fresco há quatro meses, a ficarem malhados de tons verdes e castanhos. Habituei-me que as casas das quintas não podem ser perfeitas, são grandes demais, e ficam no campo, logo a natureza conquista o seu espaço aos poucos, e até dá uma certa "patine". Mas está quentinho cá dentro, e a enorme lareira da salinha aquece a casa toda, e tira o desconforto da humidade. Acho que se não estivesse acesa todos os dias, já teriam começado a nascer cogumelos nas paredes. É bom comer os nossos ovos, e agora que a Branquinha deu à luz, termos o seu delicioso leite para beber. A natureza acalma-me a dor.

Nunca pensei que me habituasse tão bem a viver de galochas e perpetuamente com lama, ou sujidade na roupa, mas é precisamente essa forma de simplicidade de vida que me faz bem e me ajuda a conseguir levar esta caminhada para a frente.

A dor não diminui, nada disso, ela aumenta à medida que o tempo passa, mas torna-se uma dor menos pungente. Não menor, mas menos dolorosa, perdoe-me o pleonasmo. E quando a dor se torna menos áspera, só por si, isso faz-me sentir um alívio enorme. Não quero voltar a passar pelo que passei na noite de Consoada. 

Estas pequenas grandes, enormes, coisas que acontecem, como vermos nascer um cabrito, são acontecimentos que equilibram, de alguma forma, a intensidade da mágoa, porque nos distraem.

Tenho saudades Filho, imensas, infinitas, inenarráveis, mas tenho também alguma Paz. Paz que conquisto a pulso todos os dias, sobretudo naqueles em que não me apetece sair da cama, não me apetece fazer nada, mas que me obrigo a isso, sob pena de morrer, neste caso não na praia, mas no campo. Vou continuar, porque seria assim que você iria querer, como não sei, mas um bocadinho todos os dias.

E foi isso que lhe vim aqui dizer meu Amor querido. Ontem fez-me falta o seu telefonema à meia-noite em ponto, em que passávamos o ano ao telefone um com o outro. Faz-me tudo falta, tudo, sobretudo o aconchego do seu abraço apertado, mas é assim que a vida me quis fazer passar, e irei aqui continuar para honrar a sua memória.

Saudades suas meu Amor querido! Só peço uma coisa para este ano que hoje começa: que o meu coração encontre, todos os dias, alguma Paz, que me permita (con)viver com esta saudade constante que me assola!

Mil beijos da sua Mãe que o adora,

Mami



25.4.2024 - One Day plus 266 - (Still about) the Intrepids, the Freedom Lovers, the Crazy Ones...

  Ahhh meu adorado Filho, Que DELÍCIA!  Está tão, mas tão perto de mim e obrigada pelos sinais que me vai enviando, hoje especialmente.  O &...