sábado, 18 de fevereiro de 2023

18.2.2022 - One Day minus 199 - Mudanças

 




Meu adorado Filho,

Escrevo-lhe com e sob uma nova perspectiva, literalmente falando: mudei o escritório todo; detalhes mais à frente, e penso que também mudei a minha perspectiva sobre a costura, e com ela, sobre os pontos como decidimos alinhavar a nossa vida e quais as linhas que escolhemos. 

A costura envolve-nos de uma forma suave, mas muito criativa, e acima de tudo, meditativa, e consequentemente, tranquilizante. Já lhe escrevi detalhadamente sobre isso e não vou enumerar uma vez mais as vantagens desta terapia barra "hobbie" que descobri, pois já sei que me vai responder:

- "A Mãe tá toda queimada, já me contou da costura pelo menos um milhão de vezes!"

Portanto vamos ao espaço físico: mudei o escritório. Começava a ter muito poucos metros quadrados para toda a parafernália que este novo "hobbie" exige, e além disso, começo a ver mal ao perto, precisando, por isso, de mais luz. Não me fazia sentido ter uma janela de cada lado, e ter a secretária virada para a parede. Sobretudo agora no Inverno, em que a luz ainda é pouca. No Verão talvez volte à posição inicial, por causa do calor, mas agora é diferente. Fico portanto, de frente para uma das janelas, da qual vejo o jardim com os Medronheiros, as Oliveiras e vislumbro, ao longe, o pôr-do-sol. Pus uma pequena mesa em T, mas é desmontável, logo não conta para a disposição estética do espaço, mas apenas da funcional. Ao mesmo tempo, a cama que está transformada em sofá, fica numa posição muito mais agradável para os solteiros que cá venham dormir porque encostada a uma parede interna, logo mais quente. Em suma, gosto do espaço. O Miguel diz que vai ficar a divisão da casa para eu mudar à vontade sem ele se passar dos carretos, porque tem o pavor das minhas mudanças constantes, sempre em busca do que mais me apraz esteticamente. 

Mudei também o meu ponto de vista sobre o Luto de Mãe. Ele é inultrapassável, e é intemporal, infinito e constante, mas torna-se, com a Aceitação, um Luto menos pesado e acutilante, suavizando-se muito lentamente. Não deixa de ser curioso, e talvez possa ser explorado filosófica e medicamente, é como quando sentimos o nosso Filho pelas primeiras vezes no nosso ventre. De início é como se de uma borboleta se tratasse, depois são mais borboletas que nos fazem cócegas e nos mostram que aquele milagre de Vida dentro de nós cresce, um pouco mais a cada dia, e o nosso Amor cresce com ele. O (meu) Luto está a ser assim. A Paz que senti de início foi apenas um vislumbre, uma perene sensação de bem estar, porque de calma, de menos peso daquela dor pungente e torturante. E aos poucos, a Paz foi ficando por mais tempo. Segundos, minutos, horas, e agora, já lá vão uns dias. Claro que estou sempre à espera do embate, porque sentir um pouco mais de Paz ao fim de quase sete meses de tortura, sabe-me a um pedaço de Céu e não acredito que perdure, mas ao mesmo tempo, penso que só depende de mim ela perdurar.

Eu tenho a certeza de que a nossa ligação vai muito, mas muito para além da morte, ela vive noutra dimensão, caso contrário, eu não poderia sentir o Amor que sinto dentro de mim. E transformar a Dor em Amor, a cada dia que passa, é a melhor arma contra o Luto. Mas esse Amor, só o Filho dos Filhos, uma Criatura com a sua Luz poderia estar a enviar-me. E por isso eu sinto Gratidão. Porque sou uma privilegiada entre as Mães, porque carreguei, trouxe à Vida, amei e amarei, até depois da minha morte, um Ser de Luz. Sou tão grata por isso meu Filho! Por essa dádiva maravilhosa que o Universo me deu, o de ser sua Mãe e do seu irmão. 

Mudei também o horário das nossas cartas: escrevo-lhe, pela primeira vez, com a luz calma do ocaso que já passou, até ter transcrito a nossa conversa astral.

E agora que lhe esvaziei o meu coração, porque sei que vai ficar alegre e orgulhoso, vou para a costura, que hoje é o Miguel a fazer o jantar, e porque temos que consumir as dezenas de ovos que temos, vai ser "cheese-tomato-onion meets" tortilha, porque temos imensos restos de legumes e batatinhas assadas para aproveitar!

Mil beijos meu Amor adorado,

Mami

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