Meu adorado Martim,
Acabei de regressar de Lisboa. Foram dois dias muito intensos, mas de uma intensidade boa. Uma intensidade que me fez sentir viva, numa comunhão imensa consigo, mas vamos por partes. Finalmente realizei dois sonhos, e sinto que a minha vida está no caminho do Caminho, num troço muito muito íngreme, mas tenho conseguido tratar das bolhas que se vão formando e doendo, sem as deixar infectar. E assim, passo a passo, uns dias com mais dores, outros com menos, vou trilhando esta nova jornada.
Prometi-nos, quando afaguei o seu cabelo lindo e suave pela última vez, que a sua morte não seria sem significado. E dar significado à morte não é querermos morrer. É querermos ficar vivos para todos os dias recordarmos, e nessa recordação daqueles que mais amamos, mantê-los vivos no nosso coração, ((Escrevo propositadamente "mantê-los" e não "manter-vos") :-) e Você, meu querido Filho, sabe o que quero dizer!)) e só existe uma forma de o fazer, como advogo todos os dias, desde o dia dois de Agosto de dois mil e vinte e dois, que é através do AMOR. Abrir o coração ao Universo é a única forma de mitigar a dor - porque um luto de Mãe nunca sara - e assim honrar a Vida de quem cumpriu o seu papel aqui neste plano, tendo sido chamado para o outro.
A minha ligação com o Universo é cada vez maior, e o meu desprendimento das coisas terrenas diminui consideravelmente, à medida que essa ligação se fortifica. Não é fácil conviver com esta espiritualidade, pois o plano terreno, tal qual magneto invisível, prende-nos, como que querendo impedir que subamos um simples degrau neste desenvolvimento espiritual, mas consegue-se. Com trabalho, com muito trabalho interior, consegue-se. Implica também muita coragem, pois obriga-nos a confrontar os nossos maiores receios, fantasmas empoeirados que teimam em se esconder no armário. Tenho sacudido tanto, mas tanto pó, que mete impressão. Mas ando a limpar a casa e com isso, perdi o medo das aranhas. Enfrentar os medos e os terrores amedronta como o raio. Sobretudo o medo da perda. Mas se fazemos parte do Cosmos, significa que o Cosmos não nos pertence, logo, "perder" não me parece a palavra correcta, porque se nós fazemos parte de algo, então não podemos perder nada! Porque SOMOS! Mas já lhe volto a explicar isto.
Voltando à minha narrativa dos últimos dias, consegui realizar dois "sonhos" de longa data. Inscrevi-me num curso de costura como deve de ser, e fiz umas calças boca de sino, padrão floral em tons pastel, à "la sixties", mesmo "vintage", de "lycra". Suei as estopinhas, parecia que estava a coser uma cobra, mas elas lá nasceram. Senti uma satisfação imensa, e é algo que sei que irei continuar a explorar. Um dia inteiro assim de novos desafios na costura é como uma semana de terapia e de meditação: ficamos estoirados, mas felizes. Porque a "lycra" é um tecido escorregadio, que requer precisão, e não perdoa erros facilmente. A nossa concentração é só nela: basta um simples pensamento fora, e estamos tramados. E isso "limpa" a cabeça, sossega a "monkey Mind", provocando uma sensação de tranquilidade e de Paz. Claro que Você me guiou as mãos, não posso ter sido eu, pois mais uma vez tratei a máquina de costura por tu: nunca tinha mexido numa máquina de corte-e-cose, mas é de facto, um sonho tornado realidade, é como se mudássemos de uma trotineta para um Ferrari.
Ao fim de dez minutos conseguia manuseá-la??? Não fui eu...ou não foi o meu eu físico, foi o meu eu cósmico, fundido com os antepassados das suas avós, consigo, com o Universo.
O segundo acontecimento foi um Encontro de Alma Sistémica, facilitado pela Paula Ponce Alvares. Você sabe que há décadas que eu queria constelar, sem nunca ter dado esse passo. Pois bem, a tia Paula, que tem tido um papel fortíssimo na minha vida no último ano, trouxe-me a Paula Ponce Alvares; parecendo um propósito por acaso, decidi que era muito mais que isso, quando a Paula "me entra", quase em simultâneo na vida, através da Herdade do Pouchão, que veio através da tia Nicole, e com isso surge três vezes, no espaço de um mês, vinda de ângulos totalmente diferentes. Não poderia ignorar esta mensagem do Universo, ainda para mais em tríade. E lá fui. E foi espetacular. E devo dizer que senti o poder que emana das suas entranhas, quando a mão dela, suavemente pousada nas minhas costas, me pôs o coração a ferver, num calor incrível e imensamente confortável, num "Reiki" perfeito, porque totalmente dádiva de Amor. Foi como se alguém pegasse literalmente no meu coração e o consolasse de uma forma divina, fortíssima, envolvendo-me num bem-estar imenso. Eu queria uma consulta sozinha com ela, queria aquele colo cósmico que ela possui, e que se sente à distância, só para mim, mas aprendi, a muito custo, que tenho de ser grata pelo que o Universo me dá. Foi também um desafio poder observar a forma como obtém as mensagens do Universo, tal qual as poucas oportunidades que eu tive, quando me apaixonei pela Astrologia, algo que você gozava tanto, mas depois me perguntava sobre as suas namoradas!
Constelar foi muito bom, e ajudou-me a perceber que eu, sendo uma (quase) leiga, estou mesmo ligada ao Universo. Percebi também que a sua morte, ou a sua passagem para o novo plano, me veio possibilitar um aprofundar incrível de toda essa ligação. O meu "eu" passou a ser muito mais coração e muito menos cabeça. Claro que a cabeça, quando se revolta, faz motins cada vez mais tumultuosos, pois tem sido relegada para segundo plano, mas o meu coração, através desse Amor, tem crescido muito. E nesse crescimento, eu percebo que sou espírito, e que sou Amor, e que SOU.
A minha viagem tem sido dura. Muito muito dura. Chorei mais neste último ano do que em todos os outros da minha vida, todos juntos, multiplicados por vinte, o que já indica uma vetusta idade! Imensuravelmente mais. Mas também aprendi muito sobre mim. Hoje posso dizer que gosto da pessoa em que me tornei. Tenho o coração dilacerado pela dor da saudade, mas estou muito mais sábia. A sua bisavó - ainda no exercício de continuar a constelar - e também ela sofreu imensuravelmente na vida, dizia que o sofrimento enobrece. Entendo hoje a plenitude dessa afirmação. Temos duas escolhas: a morte em vida, ou o abraço de uma vida (com)sentida. Com "M", mas também consentida. E esse consentimento veio através de si. Do milagre do privilégio de ter podido ser sua Mãe. E o sentimento que veio com a sua morte, é passível de paz. A paz alcança-se através do Amor. E se hoje não tenho medo nenhum da morte, é porque você, meu Filho, minha Luz, foi à minha frente, para me iluminar o Caminho, quando chegar a minha hora. E irei com a maior das Alegrias, porque o vou reencontrar. Mas tenho ainda muito para fazer aqui neste plano, muito trabalho, muito Amor para dar ao seu irmão, e um dia aos filhos dele, muitas Mães para estreitar contra o meu peito, e um livro para escrever.
E volto à nossa última conversa, lembra-se do que lhe disse?
- "A morte perde o seu significado perante o Amor. Porque o Amor, ao ser Vida, vence a morte. E estamos, e continuamos, e acima de tudo, SOMOS. Somos UNOS, você e eu e o Universo que nos envolve."
Um beijo repleto de gratidão meu adorado Filho, e um sorriso rasgado, deste plano para esse!
Com gratidão imensa, e todo o meu Amor Universal,
Mami
P.S. Dia 23 regresso ao Trabalho, por minha iniciativa. (Estou borrada de medo)!
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